sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Across the seas 4ª parte

(continuação)

O que me leva a escrever o que recordo da Líbia? O que tem uma história de um período perdido no tempo e no espaço e na memória de poucos a ver com uma busca incessante por não sei bem o quê? Saladino quando conquistou Jerusálem aos Cristãos perguntaram-lhe o que valia Jerusálem, ele respondeu "nada" e continuou o seu caminho, a meio caminho voltou-se para trás e diz "tudo!". Tal como Saladino respondeu quando lhe perguntaram o que valia Jerusálem, eu respondo em relação ao que aqui é dito: "nada" "e tudo!".
A Líbia é parte do percurso em busca de algo, não por escolha mas por imposição, tal como a maior parte dos episódios que marcam uma vida não serem escolhidos nem desejados. Nada é como queremos.

Estive hospedado num hotel no centro de Tripoli, um hotel mediano e que suprimia as necessidades de quem se desloca em trabalho. Na vizinhança morava um senhor de idade que dava pelo nome de Masoud, senhor de uns 70 anos bem vividos e sofridos que nos dias de hoje gozava da sua reforma. Era um dos poucos Líbios com um domínio do inglês muito pouco usual por aquelas bandas, ainda para mais tendo atenção à sua idade. Passava horas à conversa com o senhor Masoud. Falávamos de Kathafi, aliás foi o único Líbio que conheci que se referia a Kathafi pelo nome, sempre com o prefixo "Mister", todos os outros referiam-se a Kathafi com líder. Foi o sr. Masoud que me arranjou uma cópia em inglês da sua doutrina, o livro conhecido como "Livro Verde". Pelas suas palavras compreendi que nem a Líbia escapa aos ventos da mudança, desabafava que a juventude líbia se desvirtuava, que já não seguiam os preceitos islâmicos da mesma forma como Kathafi tinha idealizado para o seu país, que a influência do ocidente era cada vez mais notória e que exigiam os "luxos" do ocidente para eles. Não o dizia com raiva nem frustração mas sim com o conformismo e resignação de quem já nada pode fazer e que deu conta que o seu tempo passou.
Tentava não discutir religião, talvez por ser um agnóstico confesso e não ofender o senhor que mostrava já grande abertura de espírito para discutir política, aliás, é-me mais fácil falar de assuntos dos Homens do que assuntos de uma ordem que fogem do que é racional e pragmático.
Apesar disso falámos da tradição do Ramadão, o que se faz e qual o objectivo do jejum. O Islão, ou Al Islaam, assenta em 5 pilares, um deles é o da caridade e o objectivo do Ramadão é, além de purgar o corpo de tudo o que é nefasto ao Homem, é, com o seu jejum e sede que praticam durante um mês do nascer ao pôr-do-sol, lembrar aqueles que durante todo o ano jejuam por não terem de comer.

Em suma, o que de mais importante aprendi com o senhor agraciado com a sabedoria da idade foi que o que uma família líbia deseja para os filhos aquilo que qualquer outra família em qualquer outra parte deste vasto mundo deseja... Como dizia o anúncio da Coca-Cola "estás aqui para ser feliz".

(Continua)

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